O amor é uma escolha.
- HP Charles
- 23 de fev. de 2024
- 5 min de leitura
Atualizado: 8 de nov. de 2024
Há um erro fundamental quando se acredita que o amor é um sentimento. Não é. O amor é uma escolha. O amor é uma prática. Quando eu decido amar alguém, estar com tal pessoa, ser leal e respeitá-la, isso significa estar além das flutuações dos meus sentimentos. Isso significa que não importa o momento pelo qual eu esteja passando, devo me manter fiel à escolha que fiz. Devo permancer na linha que criei para minha vida amorosa, porque foi uma escolha, porque foi a pessoa que entendi que precisava em minha vida.
E portanto não dependo de meus sentimentos ou emoções momentâneas, variáveis. Eu sei que elas irão se alterar em algum momento. Eu sei que sentimentos passam por altos e baixos. Mas e daí? O que não deve variar é a minha escolha.
Dessa forma, se eu for me relacionar baseado em sentimentos e emoções, hoje irei te amar e amanhã te odiar. Hoje você será imprescindível e amanhã será insuportável. E toda a jornada será instável e provavelmente me perderei ao longo do caminho.
Sabemos o que acontece quando tomamos decisões baseadas em sentimentos, não sabemos? Infelizmente nos dias atuais pessoas se unem e se "amam" baseadas em como se sentem "naquele momento", atendendo a seus seus humores e a todo o tipo de sensação por mais fútil e vulgar que seja. Mas as ESCOLHAS que você faz são o reflexo de quem você é como pessoa.
Quando me deparo com casais que se formaram faz longo tempo, em gerações anteriores, quando lembro de meus pais ou avós, que permaneceram juntos até o final superando as mais difíceis tempestades e doenças, me conscientizo de que isso se deu baseado em suas escolhas e votos, e não em seus desejos mais mundanos, ou em individualismos tão glorificados hodiernamente.
A filosofia do individualismo não vai fracassar. Ela já fracassou. O "primeiro eu", o "mas e eu", não conduziu a nada a não ser à solidão, à infelicidade, e a escolhas catastróficas, e essa é uma pílula cada vez mais difícil de engolir. Claro, a ideia de que você está ali para ser servido e não para servir, evidentemente vai colocar data de validade em todos as relações construídas nesse espectro. Vejam, não me refiro evidentemente aos casos de abusos, de violência, de vícios incuráveis. Não me refiro a uma condenação perpétua à infelicidade baseada em uma opção infeliz. Me refiro a desistir quando mal se tentou se reparar. Me refiro às trocas incessantes baseadas em nada além do sexo imediato e teatral face ao abandono de escolhas de vida que de repente pareceram "entendiantes". Normalmente não se troca uma pessoa por alguém melhor, mas por alguém mais fácil. Paixões duram em média dois anos. E amor não é paixão.
Não à toa os índices de felicidade estão em níveis absolutamente rasteiros, não à toa ninguém confia em mais ninguém, não à toa os divórcios se tornaram epidêmicos, assim como a baixa natalidade e a desconstituição da família nuclear como alicerce da sociedade. Não é coincidência que os grandes players invistam cada vez mais em ração para gato e vinho em caixas. Isso é o sintoma. É o mercado se adaptando.
É estimado que em 2030 entre 45% e 50% das mulheres entre 25 e 44 anos estarão solteiras e sem filhos. Mas a pergunta pertinente é: estarão mais felizes? Os homens também estarão mais felizes sozinhos, resignados ao sexo corriqueiro e banal? Tais escolhas e direções que certamente mudam o panorama do ocidente junto com seus valores, estão deixando as coisas melhores? Os índices de doenças emocionais entre os JOVENS levam a crer que não.
Qual passou a ser o objetivo hodierno real? Acúmulo e consumismo? Parece que sim. Mas poderia ser esse o objetivo de vida de alguém? Sabemos que caixão não tem gaveta. Tal propósito se justificaria? Onde se encaixa o amor nessa equação? Não se encaixa, não é mesmo?
Tenho lido estupefato cada vez mais casos de abandonos de parceiros por motivos de doença, por exemplo. Casais que por uma adversidade como um câncer, uma esclerose múltipla, uma debilidade física ou emocional qualquer, simplesmente deram fim a uma relação para a constituição de outra (tão inócua quanto a anterior) mas sem o tal "inconveniente". E o pior, há uma absurda relativização de tal conduta. Senhores, me digam como isso pode dar certo a médio prazo?
Faz pouco tempo escrevi nesse blog texto sobre o abandono de idosos na Alemanha. Algo de cortar o coração, além de beirar o surreal. E tudo isso me faz acreditar cada vez mais no título desse post. Provavelmente muitos que lerão esse texto me verão como um dinossauro à beira da extinção, mas isso não significa que eu esteja errado em minhas observações.
Sim, as redes sociais fomentam, acolhem, constroem e formam diariamente novos psicopatas e narcisistas, e para eles a empatia não existe. Mas tratamos "in casu" de pessoas normais. Pessoas que sentem. Que se importam. Sim, todos desejam conforto, padrão, mas a que custo? É preciso se olhar no espelho para se barbear.
Do que VOCÊ está disposto a abdicar para ser feliz? E mais...o que realmente te faz feliz? O que aquece seu coração? O que te faz dormir melhor ultrapassadas as necessidades básicas de moradia, alimentação e vestimentas? Mais uma bolsa? Mais um par de tênis? Um computador novo? Um carro novo para desfilar em cidades sem a mínima segurança pública?
E então? Que tal a ideia de abrigo emocional, confiança, crescimento de mãos dadas, afeto genuíno? É óbvio que o amor é uma escolha e que não pode ser mesurado por humores, percepções e desejos fluídos e pedestres. E muito menos baseado no MEDO DO ABANDONO como critério, visto que o individualismo que impera destruiu essa condição como uma realidade, para instituir o farinha pouca, meu pirão primeiro.
É preciso que amar seja algo mais. E esse algo mais tem a ver com CARÁTER. Sim, ESCOLHA o amor. Mas um que valha a pena. Um que supere um exame médico infeliz, um que supere, por que não, o sobrepeso, a calvície, a idade (que chegará para todos), um que supere as incertezas dos padrões de consumo, um que coloque a lealdade no topo da lista. Um que te faça se sentir sempre junto, mesmo estando longe, e não ao contrário, como aquela relação que te faz sentir só mesmo dividindo um sofá.
Sim, amar é uma escolha. Mas se for amar, ame de verdade. Será que como espécie ainda conseguimos? Será que ainda somos capazes? Pessoas não abandonam pessoas a quem amam. Abandonam pessoas a quem usam.
"Esquecemos o amor, a amizade, o trabalho bem feito. O que se consome, o que se compra, são apenas sedativos morais que tranquilizam seus escrúpulos éticos". (Zygmunt Bauman)
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