
A importância dos encerramentos emocionais.
- HP Charles

- 11 de fev. de 2024
- 4 min de leitura
A psicologia é praticamente consensual no que se refere a necessidade de encerramento dos ciclos que afetam de alguma forma a nossa saúde mental. Quando escrevo encerramento me refiro ao "closure".
O rompimento abrupto e aparentemente prematuro de uma relação, seja ela qual for, deixa em suspenso, de alguma forma, o próprio encerramento. Mesmo que ele ocorra de fato no mundo físico a nossa mente carece de uma conclusão psicológica. A menos que você seja um psicopata, onde o outro seja desumanizado, ou um narcisista que propositalmente impede o closure, a fim de postergar sofrimento e culpa, pois a empatia desaparece por inteiro, o ser humano carece ouvir e ser ouvido uma última vez onde todas as cartas serão expostas e lacunas sejam deslindadas. Aliás reparem como psicopatas e narcisistas JAMAIS oferecem closure. Não é coincidência. Existe um padrão que sempre se repete. Saúde mental só é relevante para quem a possui, para quem a deseja, ou para quem tem consciência que é possível conquistá-la. "Pessoas diferentes fazem diferentes acordos com o Diabo".
Caso tal encerramento não seja traduzido em alguma conversa, em alguma "lavagem de roupa", marcas indeléveis permanecerão em nossas mentes. As vezes por décadas. Ocorre uma prorrogação do luto que pode até ser enterrado, mas só será vencido por completo de uma forma muito mais trabalhosa, por vezes apenas com terapia.
Eu sei por experiência própria que, por conseguir dar adeus a meu pai e dizer o quanto o amava e o quanto ele foi importante para mim em seus momentos finais, um enorme peso saiu de meu coração. Não tive a mesma sorte com minha mãe e isso me catapultou para um buraco de onde até hoje luto para sair. É como se houvesse uma presença na grande ausência dentro de mim. Há uma melhora pela ação do tempo, mas a digestão é infinitamente mais longa e difícil. Provavelmente carregarei com menos sacrifício esse sentimento com o passar dos anos, mas suspeito que a ausência de um encontro final será perene em meu coração. E eu então o imagino de meu jeito com frequência.
Nos relacionamentos afetivos, hoje temos a figura do "ghosting" (cada vez mais comum em um mundo eivado de narcisistas, e de gente de pouco caráter), onde a pessoa simplesmente some, deixando um enorme vazio e incomprensão em seu lugar. O desaparecimento repentino cria uma lesão difícil de fechar na pessoa abandonada. O que ocorre é que o "encerramento" é vilipendiado. O "amor" em tempos de likes criou essa figura abjeta e cruel, onde sempre um covarde, tenta massacrar o outro ser humano. Claro que um dia o jogo vira.
A última conversa, o último "desencontro" pode ser desagradável, doloroso, mas é necessário. Para AMBOS. Conheço pessoas que guardam escaramuças profissionais há 10 anos. Como isso se explica? Simples...o encerramento se deu na empresa, na relação de trabalho, mas não na mente. Jamais houve uma conversa, uma explicação que concluísse aquela relação, aquela suposta deslealdade.
Conheci pessoas que trabalharam em UTIs com pacientes terminais e que foram testemunhas de pedidos de reencontros com pessoas que já não viam há 30, 40 anos. Aquelas questões jamais se resolveram. O quão triste e desnecessário é isso? Orgulho, ódio, medo. Filhos que se tornam incapazes de perdoar os pais. Esposas e maridos de longa data que se tornam inimigos, adversários, alheios ao perdão e prisioneiros da mágoa. O fingimento da desimportância. Tudo isso apenas expõe e confirma patologias, não força.
Meu pai se alienou de seus próprios pais muito jovem, e não questiono suas razões. Apanhou, sofreu nas mãos de uma mãe que nunca lhe direcionou afeto. Não sei o quanto isso o machucou, mas meu pai carregou esse fardo silencioso até sua morte. Jamais conseguiu perdoá-la e retomar algum contato.
Sim, por vezes é preciso tempo. É preciso estabilidade emocional para lidar com os ressentimentos. Mas eles precisam ser alcançados, transformados, ressignificados vez que uma vez aquele sentimento supostamente foi amor, admiração ou qualquer forma positiva de afeto. Vivemos uma vida duríssima, repleta de decepções e inseguranças, mas a saída para isso sempre será o perdão e o encerramento. Eles são os bálsamos que permitem que o resto da estrada seja percorrido em paz.
É preciso inclusive perdoar a si mesmo. Pelos erros, pelos excessos, pelas palavras mal atiradas. A alternativa é carregar esse peso até o fim. E não nos enganemos, ele irá no banco do carona para onde formos. Para outro bairro, para outra cidade, para outro país. Fugir não adianta.
Confesso que possuo duas ou três cicatrizes que ainda precisam ser fechadas e espero um dia ter a oportunidade de curá-las completamente. Em pouco tempo sanei algumas e para minha surpresa, o desejo sempre foi mútuo. E não poderia ser diferente quando conhecemos o caráter do outro após a tempestade e a aspereza. Há uma enorme beleza e paz nas mãos apertadas novamente.
Vou me arriscar a algo que quase sempre é impróprio e deixar um conselho. Se há uma rusga em seu coração, não importa quanto tempo passou, não finja indiferença, não compartimentalize a mágoa, a ejete de sua mente e sinta o imediato alívio que isso lhe trará. Com sorte você recuperará uma amizade ou criará uma nova, totalmente intocada, pura. Sim, isso é possível se o perdão for genuíno.
Faça o que é preciso. Se redima, se renove, perdoe primeiro a si mesmo e depois ao outro a quem um dia já foi tão importante para você. Encerre o ciclo, se liberte das algemas da amargura e então seja plenamente feliz, inclusive em suas memórias. E se isso não for possível e você genuinamente acreditar que a pessoa do outro lado não merece o esforço ou você compreendeu que ele não é mais necessário, então VOCÊ JÁ CONQUISTOU SEU ENCERRAMENTO. Agora é só seguir em frente e recomeçar. Sim, porque todo encerramento é também um recomeço.





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